Newsletter #30 - Estratificação de Risco: o ponto de partida para uma reabilitação segura

07/10/2025

Antes de prescrever, é preciso estratificar


               Que o exercício é amplamente recomendado e seguro para praticamente todas as pessoas — com ou sem doença cardiovascular — ninguém duvida. Mas, no dia a dia de um programa de reabilitação cardiovascular, nem sempre é simples calcular o risco que um paciente tem ao se exercitar. 

              Outra dúvida frequente na prática clínica surge quando o paciente pergunta se pode treinar por conta própria, sem supervisão. De acordo com as principais diretrizes e livros-texto da área, pessoas com risco elevado de eventos adversosdurante o exercício não devem realizá-lo sem acompanhamento direto de um profissional experiente em fisiologia clínica do exercício.

             Sendo um tema tão essencial para a prática clínica, nesta edição da newsletter da Central vamos discutir os principais critérios para estratificar o risco cardiovascular de cada paciente. Entender esses parâmetros é fundamental para ajustar a intensidade do exercício, o nível de supervisão e todas as decisões que garantem a segurança e a eficácia do processo de reabilitação.

Qual é a prevalência de eventos adversos em programas de reabilitação cardiovascular?

             Apesar de ocorrer em um ambiente supervisionado e controlado, o exercício físico pode, em raras situações, desencadear eventos adversos graves, como  infarto agudo do miocárdio ou morte súbita cardíaca. Felizmente, esses eventos são extremamente incomuns.

             Nos anos 1970, relatava-se cerca de um evento grave a cada 15 mil horas de exercício supervisionado. Com a evolução dos protocolos, dos critérios de triagem e das estratégias de monitorização, esse número despencou.

             Dados recentes (2020) indicam uma média de um caso de morte súbita a cada 219.970 horas de exercício. Mesmo em modalidades de maior intensidade, como o treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT), a taxa continua muito baixa — aproximadamente um evento grave a cada 2.227 horas de exercício. Esses números reforçam a segurança e a eficácia da prática quando conduzida com critérios clínicos e fisiológicos bem definidos.

            Ainda assim, um único evento adverso no seu serviço é suficiente para gerar grande preocupação — para o profissional, para a equipe e, sobretudo, para o paciente. Mesmo com todos os cuidados, imprevistos podem acontecer, e isso não significa erro. Por isso, a melhor estratégia é antecipar-se aos riscos, reconhecendo sinais clínicos e funcionais que indicam maior vulnerabilidade ao esforço.

             Com essas informações em mãos, é possível prescrever com segurança, ajustando intensidade, ambiente e supervisão de forma personalizada para cada paciente.

Quem é o paciente de alto risco?


            Diversos documentos internacionais definem critérios específicos para a estratificação do risco cardiovascular, mas todos incluem, em essência, a aptidão cardiorrespiratória, a presença de sintomas ao esforço (como angina ou dispneia), arritmias e o tempo desde a última intervenção cirúrgica ou internação.

            Aqui, consideramos os critérios descritos na Diretriz Brasileira de Reabilitação Cardiovascular (2020) e na Diretriz Sul-americana (2014).

          São considerados de alto risco os indivíduos que apresentam baixa capacidade funcional (teste de esforço < 5 METs), isquemia em cargas baixas de esforço, insuficiência cardíaca avançada (classe III–IV) ou características clínicas agravantes, como doença renal dialítica, dessaturação de oxigênio ao esforço, arritmias ventriculares complexas ou resposta hipotensiva/bradicárdica durante o exercício.A presença de apenas um desses critérios já é suficiente para classificar o paciente como alto risco. 

           Esses pacientes exigem monitorização contínua, ambiente equipado e equipe treinada para lidar com intercorrências — o exercício nunca deve ser realizado sem supervisão direta.

Quem não pode iniciar a reabilitação cardíaca?


            É importante diferenciar alto risco de contraindicação.O paciente de alto risco pode e deve participar da reabilitação, desde que com cautela e supervisão adequada. Já aqueles que aprese
ntam contraindicações absolutas não devem iniciar o programa de exercícios até que a condição seja resolvida.

Entre as principais contraindicações estão:

  • Angina instável ou sintomas isquêmicos em repouso;
  • Insuficiência cardíaca descompensada
  • ou edema agudo de pulmão;
  • Arritmias ventriculares graves não controladas;
  • Hipertensão arterial não controlada (≥ 200/110 mmHg em repouso);
  • Estenose aórtica grave sintomática;
  • Miocardite ou pericardite aguda;
  • Tromboembolismo pulmonar agudo ou dissecção de aorta;
  • Infecção sistêmica ou condição metabólica aguda.

A Central criou uma ferramenta para te ajudar

             Para facilitar o processo de estratificação de risco, a Central da Reabilitação desenvolveu uma calculadora interativabaseada nos critérios da Diretriz Brasileira de Reabilitação Cardiovascular (SBC, 2020) e nas Diretriz Sul-Americana de Reabilitação Cardiovascular (2014).Essa ferramenta permite que o profissional insera informações clínicas e funcionais do paciente e, de forma automática, obter a classificação de risco e o nível de supervisão recomendado

             O melhor é que a calculadora indica exatamente quais critérios estão sendo considerados na definição do risco — tornando o raciocínio clínico mais transparente, rápido e didático.

            O acesso é totalmente gratuito e está disponível nosso: CLIQUE AQUI 

Quer se aprofundar mais?


              Se o seu paciente foi classificado como de alto risco — ou se você quer compreender a fundo os critérios utilizados —, recomendo fortemente que estude conosco e aprofunde seus conhecimentos em avaliação e prescrição clínica do exercício.
Na CentralFlix, você encontra uma série completa sobre fisiologia clínica do exercício e reabilitação cardiovascular, com aulas sobre protocolos de avaliação funcional, prescrição segura e discussão de casos reais.

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Francisco Oliveira

 Divulgador científico - Central da Reabilitação 


Referências

 Laurino MJL, Pinheiro DG, Silva JM, Ribeiro F, Valente HB, Vanderlei LCM. Predicting the occurrence of minor adverse events in cardiac rehabilitation using physical variables. Sci Rep. 2024;14:17179. doi:10.1038/s41598-024-68223-y

Carvalho T, Milani M, Ferraz AS, Silveira AD, Herdy AH, Hossri CAC, et al. Diretriz Brasileira de Reabilitação Cardiovascular – 2020. Arq Bras Cardiol. 2020; 114(5):943-987.

Herdy AH, López-Jimenez F, Terzic CP, Milani M, Stein R, Carvalho T; Sociedade Brasileira de Cardiologia. Diretriz Sul-Americana de Prevenção e Reabilitação Cardiovascular. Arq Bras Cardiol 2014; 103(2Supl.1): 1-31.